Fui uma sombra, perseguia qualquer pessoa que passava pela iluminação aparente dos raios de sol. Encostava-se a cada ser pensante com uma má intenção de roubar-lhe algo que me interessava, de alguns eu roubava somente os brincos de brilhantes para a minha coleção de jóias, de outros eu cometia o maior dos crimes, tirava-lhe a esperança de continuar a andar por onde o sol batia. Certa vez encantei-me pelo casaco de plumas de uma senhora de olhos verdes, como de alguém só poderia roubar um único item, fiquei com o casaco. Os olhos me pareceram tão fúteis, só uma cor, um enfeite. O casaco que estava sobre os meus ombros joguei na soleira da porta, deixei lá como objeto inútil que era, não tinha importância pra mim se os que cobriam os meus ombros eram bem mais vistosos. Apaixonei-me pela futilidade aparente, abandonei o que não me era interessante por medo de ser vista como pessoa que tinha algo em comum com outras pessoas. Decidi então sair da sombra, apanhei meu casaco surrado - que carregava lembranças em cada costura, e me arrisquei em qualquer faísca de luz que me arrastasse. De mim roubaram somente o coração, pouco importa, não o usava a pouco menos de uma década.
Hélida Carvalho
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