segunda-feira, 16 de abril de 2012

Nane é apelido?


     As ruas de Vancouver pediam pelos passos de Nane naquela noite. Quem sabe alguma surpresa aguardava, ou só as luzes da cidade a chamavam a atenção mesmo. O termômetro na praça marcava frio, mas nada comparado com o bloco dentro do peito.  O vento a chamava pra sentar num banco daquela praça, um que não tivesse ninguém ao lado, ela queria só sentar e assistir as pessoas passarem. Queria decifrar cada pessoa ali, saber se Deus havia a dado um presente, enxergar através dos olhos, através dos dedos finos das mãos, mesmo olhando torto para Nane, todos viam a beleza que aqueles olhos pesados carregavam. Mesmo quando nublados ensolaravam os dias de chuva no campus da Getulio Vargas, ou faziam tempestade numa bacia d’água só porque seu chá estava frio. A intensidade assinava os contratos de amor, não tinha pena de gastar todas as lágrimas numa simples foto pra aparentar distante ou bonita, num álbum inteiro pra parecer modelo. Ela queria recordações épicas, diálogos ensaiados com o inimigo que dormia ao lado, ela queria que a vontade de viver a acordasse, mas que dessa ela não acompanharia até a porta, pediria pra ficar uma década ou duas. Que a paz interior abandonasse a tenda dentro dela e ganhasse o mundo.

     Nane era faceira, tinha malicia no olhar. Entre lágrimas, a conversa tinha outro destino.

   Arrumou as malas, as roupas estavam fileira, deixou uma no canto da mala como especial, vestiria quanto o encontrasse. Seu urso carregava o fardo de ter o mesmo nome e cheiro dele. Dele quem?! Ele existia, Nane? Se existiu foi como uma passagem no sol, como sombra no deserto. Porque não trazer bagagem pra um estranho, porque não trazer guerra pra um território em paz. Sem bandeiras brancas, sem bombardear, sem lutar, só com o peso das palavras o atingiu. O destruiu sem piedade, o jogou no canto da rua, não houve comparação, não havia preço dado aquela noite. Quem dera pudéssemos mais, se nos entregarmos mais, se nós quiséssemos mais. Mas queria o menos, em nossas contas só haviam subtrações, mas Nane não podia arcar com as conseqüências dos acordos feitos pela Intensidade. Então ela só caminhou por aquelas ruas, até se perder numa praça bonita para se achar num quarto de hotel.

  Casa é onde você tem vontade de ficar só de meias.
  Nane estava dormindo de tênis.
Hélida Carvalho

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Trecho de "Eu, delírio."

"Sendo despertado por amantes que batem na porta às 5:50h da manhã e esperam ser atendidos com um belo sorriso, e um exalo leve do cheiro que carrego. Devo avisa-los que veneno tem gosto doce, e é um delírio em fim de tarde. Não acostume-se com o sabor, se não vai beber dessa água por muito tempo."

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Escrevo porque não posso sair gritando nas ruas, ou talvez escrevo porque ainda não tenho o que falar. Hélida Carvalho, inspirada na musica que me ouve.

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